OPINIÃO

A inspiração acaba de levar um tiro

Rosi Czepula Meassi

A Lua, um grande amor, a natureza, a garota de Ipanema e tantas outras garotas e garotos já serviram de inspiração para grandes poetas apaixonados construírem seus versos, musicados ou não. Mas, de uns tempos pra cá, não sei se é por falta de amor ou por falta de garotas e garotos, mas o fato é que a inspiração principalmente para a música brasileira está em queda livre. Tudo bem que a natureza tão degradada, maltratada e desrespeitada quase não consegue inspirar nem os mais aguerridos ambientalistas, quanto mais compositores. Mas e a Lua? Essa me parece que continua igual e está sempre lá, imponente e majestosa. E mesmo assim já não inspira quase ninguém.

Tudo aconteceu muito rápido. Um dia fomos dormir ouvindo belas e inspiradas canções e, de repente, acordamos de sobressalto com um estampido. Sim, acordamos com um tiro. Totalmente desprotegidos, fomos atingidos em cheio, ali na cama, em pleno amanhecer. E, ao contrário do que pensávamos, aquele barulho não vinha da rua ou de outro cômodo da casa. Ele vinha do aparelho celular sintonizado em determinada emissora de rádio e programado para tocar ou “disparar” naquele horário. O tiro, acreditem, vinha de uma música, daquelas que parecem chiclete que todo mundo repete feito um hino. Hino não, porque esse tipo de manifestação parece mais um grito de guerra, afinal tiro tem mais a ver com guerra e tristeza do que com música e alegria.

A verdade é que a violência passou a ser algo rotineiro, tão rotineiro que foi incorporada à cultura e à música que vende porque as pessoas consomem. E em nome da democracia, da política da boa vizinhança e da liberdade de expressão, acabamos aceitando toda essa realidade torta e triste. Nada de Lua, de amor, de natureza ou de garotas bonitas. Agora, a violência passa a inspirar versos para divertir pessoas, tiro é refrão de música e é sinônimo de alegria. Que tristeza.

É lamentável, mas o fato é que já estamos acostumados com notícias que narram tiroteios e assassinatos pelos motivos mais banais e na maioria das vezes, sem motivo algum. Notícias de crianças, mães e pais de família que foram encontrados por uma bala perdida. Bala perdida, não. A gente perde carteira, chave, celular, mas bala, bala não. Bala é disparada deliberadamente para matar ou mutilar pessoas.

E isso é inspirador?

Rosi Czepula Meassi é jornalista

 

 

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