OPINIÃO

Estamos em tempos de COVID – Conflito de Opiniões: Vestígio Invasivo de Diferenças

 

Por Delair Borges

“Está é sua mente. Esta é mente mente. Esta é pode mente. Esta é receber mente. Esta é informações mente. Esta é sem mente. Esta é você mente. Esta é sequer mente. Esta é perceber mente”. O que você entendeu? Penso que não encontrou coerência, certo? Pois bem. Volte, por favor, e releia apenas a terceira palavra de cada frase e você terá apenas uma pequena amostra de como é um ser influenciável. E, sendo assim, não importa no quê acredita, você foi sugestionado a crer assim.

Dou outro exemplo. Recebi um vídeo pelo WhatsApp (e eu raramente assisto vídeos que me enviam) cujo início tinha a seguinte frase: “O autor é tão boa pessoa que, em momento algum, pensou em assinar este texto”. Partindo desse pressuposto eu não sou boa pessoa porque assinei este texto que você está lendo… Suponho que possa discordar disso. Mas, independente de você concordar ou discordar, há uma crença nesse enunciado que, se você não traz para o nível consciente, certamente se aloja em sua mente de modo imperceptível a opinião de que um texto sem autoria é de gente boa e, consequentemente, um texto com autoria não o é…

Por que começo assim? Para lhe dizer que você foi sugestionado a ter as opiniões que têm! Chocado(a)? Ninguém é um ser isento de influências. Você pensa como pensa porque foi levado a isso pelas pessoas com quem conviveu e pelas experiências que teve ou não teve. Além disso, nenhum de nós tem o fato em nossa mente; todos temos armazenada a interpretação do fato. Ou discorda disso? Será que um simples mortal tem a verdade em sua mente? Com exceção de Jesus que afirmou não apenas ter, mas ser a Verdade, o restante de nós tem apenas a interpretação da realidade (e isso também é uma opinião fundamentada na fé cristã). Ou existe entre nós alguém que ousa dizer-se detentor da verdade e não apenas de um significado pessoal dado a ela? Sendo assim, por que pessoas sensatas discordam veementemente de pontos de vista contrários e se esforçam para mudar a opinião do outro?

Estamos vivendo uma época de tanto discurso de tolerância e de tantas intolerâncias no comportamento… Em redes sociais vivemos um tempo que está deixando rastros de vestígios invasivos de diferenças gritantes. Não estou falando de ideologias de gêneros ou tipos de governo ou qualquer outra grande diferença. Me refiro às diferenças de opiniões sendo idolatradas, é uma apologia (oculta) à crítica ao que pensa diferente de si próprio. Tem opinião diferente da minha? Você está errado(a)! E faz-se questão de confrontar modos de pensar.

Um exemplo: Eu tenho a sensação que ainda estamos presos no tempo. Paramos em outubro de 2018. Há os que apoiam Bolsonaro e os que não o apoiam; há os que apoiam o PT e os que não o apoiam; e há os demais. Discussões intermináveis passam a impressão de que ainda estamos em época de eleição. Só que agora temos os de esquerda, os de direita e um novo lado (?) nessa lateralidade: os do Centrão. Estamos num regime democrático, portanto, venceu a maioria (é assim desde que me conheço como gente). Mas estamos vivendo algo novo, é como se, após o concurso público, os pretendentes à vaga continuassem tentando derrubar os que a conseguiram e continuassem estudando para o concurso, como se ele não tivesse ocorrido. É curioso isso… E como se fosse muito submisso e dócil se assumir de esquerda ou de direita. Como se houvesse uma crença de que os mais inteligentes não apoiam nem um, nem outro. Surgem, portanto, os isentos. E agora cada um tem dois lados para criticar…

E, para engrossar o caldo, temos o COVID-19 dividindo opiniões. Isolamento total e quem pensa diferente está errado. Isolamento parcial e quem pensa diferente é ignorante. Enfim, posicionamento político ou com respeito a essa pandemia que divergem são grotescamente considerados como idiotas. Porque a inteligência ególatra se acredita superior…

E isso tudo tem desestabilizado ou encerrado muitos relacionamentos. Simplesmente porque existe uma grande dificuldade na prática daquilo que as pessoas acham bonito na teoria: respeitar as diferenças. Seria tão bom se tivéssemos liberdade para pensar diferente e continuar sendo amigos, não é mesmo? Com o tempo, porém, muitos aprenderam que isso se torna quase impossível em tempos de COVID (Conflito de Opiniões: Vestígio Invasivo de Diferenças)…

Quem ousa expor opiniões pessoais está se colocando como alvo de tomatadas. Porque não importa qual seja a opinião sempre haverá os do contra e os favoráveis que usarão da liberdade virtual para criticar. Então, há duas escolhas: ou não se expõe opiniões e se preservam relacionamentos ou se expõe e perdem-se relacionamentos. E ainda não se posicionar não lhe dá garantia de estar livre de críticas. Jesus mesmo ensinou-nos isso. Ele disse algo como: ‘O João não bebia e comia pouco e foi acusado de ter demônio por causa disso. Eu como e bebo e vocês dizem que sou guloso e beberrão’ (Lc 7:33,34). Ou seja, não importa o que você faça, sempre terá os que vão criticar…

Seria utópico imaginar pessoas COnVIvenDo, com liberdade para se posicionarem e aceitando igualmente posicionamentos diferentes? Gente, toda opinião (e eu disse ‘toda’) tem um histórico de vida nela! A opinião é a ponta do iceberg, o que a sustenta é uma grande história de vida oculta aos olhos e ouvidos dos demais – e, às vezes, da própria pessoa… Quem tem a mesma história que a sua? Ninguém! Conhecemos a vida dos que pensam diferente de nós e o que os levou a ter tal posicionamento? Desconhecemos. Gente, toda opinião é um sentimento disfarçado! Sentimento esse que existe por conta da própria história de vida.

Quando se discute com alguém por causa de opiniões diferentes isso é prova de intolerância, de desamor à história alheia desconhecida e criticada, de que se acredita possuir a verdade e o outro está nas trevas da ignorância. Poderíamos usar muitas reflexões filosóficas para dizer isso, ou mesmo muitas linhas de pesquisas ou muitos tipos de conhecimento pelo homem produzido. Mas basta lembrarmos do que toda pessoa de bem sabe na teoria: respeitar o outro como se quer ser respeitado, amá-lo sendo outra pessoa como é, ou seja, ele(a) não é à minha imagem e semelhança. Porque, além disso, a discussão é infindável e eu, nestes momentos, lembro sempre do que Einstein nos deixou registrado: “Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, em relação ao universo, ainda não tenho certeza absoluta”. Se entendermos a estupidez humana como sendo o não saber conviver com quem não sou eu, isso tudo faz muito sentido, não é mesmo?

E se você pensa diferente de mim podemos não discutir, certo? Você e eu temos toda liberdade de expressão. Mas, ainda assim, tomemos cuidado: isso não nos garante proteção às críticas. E amar quem me critica é muito difícil, não é mesmo? É difícil, mas é possível! Aliás, tudo é possível ao que crê…

 

Delair Borges é escritora (“Eduardo Foge”)

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