Extremismo evangélico perigoso
Por Delair Borges
Dia 31 de outubro é comemorado o Dia da Reforma Protestante. Martinho Lutero, monge católico, questionou o Catolicismo – que estabeleceu que a tradição da Igreja era mais importante que a Bíblia. Que tradições eram essas? Compra da salvação, idolatria, sacerdotes que se consideravam mediadores entre Deus e os homens comuns, e a proibição das Escrituras para o povo. Lutero desejava implantar a volta da ‘Solla Scriptura’ – ‘Somente a Bíblia’.
Em várias outras partes do mundo, houve mais reformadores que iniciaram uma revolução espiritual e política, abalando, portanto, toda a estrutura social da época. Obviamente, o Inimigo revidou e muitos pagaram essa ousadia com a própria vida.
Depois desses reformadores vieram os ‘Avivalistas’ (aqueles que procuravam tirar a Igreja Reformada da ‘Solla Scriptura’ morta e levá-los para o mover do Espírito). Por conta disso, surgiu o movimento pentecostal. Igrejas tradicionais (Metodistas, Presbiterianas e Batistas, por exemplo), foram abaladas por esses movimentos de renovação. Assim, os cristãos se viram entre dois posicionamentos opostos e extremos.
O que vemos acontecer hoje é algo parecido, pois assim como os reformadores não aguentaram mais as regras não-bíblicas do Catolicismo ou como os pentecostais que reagiram à dita mornidão das igrejas tradicionais, os ‘protestantes evangélicos’ de hoje seguem na mesma linha. Eles discordam das igrejas evangélicas atuais (seja tradicional ou pentecostal) e, portanto, rejeitam esse sistema (hierarquia, cargos, títulos, privilégios, shows gospels, ídolos cristãos, costumes estranhos às Escrituras etc.).
O problema é que agora estamos entrando numa fase radical, onde os ‘reformadores atuais’ foram para um extremo perigoso que beira a heresia, chegando ao ponto de relegarem partes da Escrituras como inúteis, ultrapassadas e descartáveis. Dentre os tais grupos, alguns, alegando ser seguidores somente de Jesus, não aceitam nada do Antigo Testamento, dizendo ser a Velha Aliança. Outros vão mais longe e incluem até mesmo os quatro evangelhos (Mt, Mc, Lc e Jo) e Atos 1 como fazendo parte do Velho Testamento. Isso porque eles alegam que o Novo Testamento se inicia após a vinda do Espírito Santo. Também há aqueles que só aceitam os escritos de Paulo e abominam os dízimos e as ofertas – alegando ser isso práticas do Antigo Testamento – e, (pasme!) até mesmo a Ceia do Senhor.
Infelizmente o que vemos é que, protestando contra o sistema atual, correm o risco de tornarem-se piores do que aquilo que criticam. E alguns, pretextando a libertação do atual sistema opressor e de suas regras, tornaram-se mais controladores ainda. Rejeitando o título de pastores, tornaram-se líderes sem título, praticando o que abominam. Ou seja, sendo contrários à liderança formal, tornaram-se informais controladores.
Assim crendo, tais grupos correm o risco de se tornarem uma seita cristã. Vejamos apenas três características para um grupo se enquadrar nessa categoria: 1) Descobertas especiais ou exclusivas – o líder e fundador pensa ter reinventado a roda quando seleciona trechos/livros bíblicos válidos atualmente e exclui outros. Ou seja, confeccionam uma Bíblia ‘à sua própria imagem e semelhança’, diferente do restante das igrejas evangélicas; 2) Atenção bíblica segmentada – consiste em focar não na Bíblia como um todo, mas em versículos isolados a fim de salientar suas doutrinas controversas; 3) Exclusivismo religioso – julgando-se detentores de revelações e práticas que os demais grupos cristãos não têm, incorrem no grave erro da soberba. E Deus resiste aos soberbos…
Ao que parece, falta uma clara diferenciação entre a são doutrina e a tradição dos homens, e também entre o logos (palavra escrita) e a rhema (palavra revelada). Aqui cabe bem o conselho dos Moravianos: quanto às coisas essenciais (existe um único Deus e Criador, a Bíblia como inspiração divina, salvação somente através de Jesus Cristo e a igreja como corpo de Cristo) é necessário ter unidade; quanto às secundárias (guarda de dias, vestimenta, alimentação, entretenimento, tipo de culto, etc) é preciso respeito e tolerância à diversidade; e quanto ao mais, o amor (ou seja, independente das coisas primárias e secundárias deve existir amor entre os filhos de Deus).
Nós podemos não ser unânimes, mas termos unidade. É isso que Jesus pretendia dizer quando orou em João 17: ‘A fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste’.